XVII ENG: MANIFESTO DA AGB BELO HORIZONTE

09/03/2012 17:57

O Encontro Nacional de Geógrafos (ENG) é um momento de debate, de troca de ideias, de formação, de tomada de posições políticas, de diversão, de conhecimento, de reconhecimento e críticas às geografias realizadas no Brasil. O ENG vai para sua 17º edição e, por isso, muito já foi a sua contribuição para a geografia brasileira. Entretanto, a qualidade deste encontro depende do entendimento e da concepção que os sujeitos que o constroem têm sobre as relações aí implicadas e o tanto quanto estes sujeitos conseguem imprimi-los na sua realização. Espera-se que tais concepções e entendimentos materializem-se, o mais possível, nas formas que dão corpo ao ENG. É certo que tal materialização exige tempo e trabalho, mas é preciso que nos esforcemos para que as palavras não se esvaiam pulverizadas na prosa do mundo.

Na Reunião de Gestão Coletiva (RGC) ocorrida em Belo Horizonte, em fevereiro de 2011, tirou-se alguns princípios norteadores à construção do XVII Encontro Nacional de Geógrafos, tais como “deve ser um processo que se inicia agora [naquele momento], na 106ª RGC”, que o “ENG é a organicidade da AGB e deve dar vazão a todas as instâncias da entidade”, que seja “público e deve construir conhecimento e práticas públicas”, “buscar nos movimentos populares possíveis parcerias para a construção do ENG”, que o encontro “integre a comunidade local em atividades e na organização do evento”, que se aprofunde “o debate sobre quais são as pautas gerais da agenda política nacional que interessam à AGB hoje”, dentre outros.

Esses princípios de nada valerão se não encontrarem expressão prática. Por isso, pretende-se, com este manifesto, conclamar todas as instâncias da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), enfim, os sujeitos que dão vida à entidade, a encontrarem meios de realização desses princípios estabelecidos.

Como processo, o ENG já se iniciou. Fundamentalmente, deve-se pensar a construção do encontro a partir do processo de amadurecimento das relações com os movimentos sociais e com o movimento real, das ideias, ações e processos e suas relações de elaboração de questões, conhecimentos e práticas. A organicidade pretendida para o XVII ENG deve, então, se realizar a partir e para esta noção. Precisamos fazer um esforço para que o ENG, e a própria AGB, continue contribuindo para a geografia brasileira de maneira consistente, pensar a realidade de forma a colocar a entidade no movimento, ou melhor, ser o movimento, isto é, produzir o movimento da história.

Para tanto, há de ser sua condição a força da Associação, maior que a mera soma das forças individuais, forma e conteúdo de participação que não incorre em hierarquias internas e, principalmente, aceitação passiva e acrítica de determinações heterônimas, a exemplo da mercantilização das atividades do conhecimento e sua relação dialética com o mundo. Sendo produção do movimento do mundo, além de participar dos mais diversos movimentos sociais, a própria Associação deve ser um canal de expressão e ação da sociedade propondo e realizando atividades públicas voltadas para o debate e a ação.

Enfim, esperamos que o resultado deste esforço coletivo, desta associação de esforços, seja um Encontro Nacional de Geógrafos em que as várias geografias produzidas país afora possam realizar o debate, a troca de ideias, a formação, a tomada de posições políticas, a diversão, o conhecimento e o reconhecimento para além de palavras jogadas ao vento. A proposta que esta Seção Local encaminha à AGB como um todo é a da promoção dialogada e compartilhada por parte de suas instâncias – Seções Locais, GTs, Diretorias, comissões, agrupamentos de associados(as), etc. – de atividades que consubstanciem os princípios definidos pela entidade para o XVII ENG. Tal calendário deve se definir pela convicção e autonomia desses sujeitos.
 

Belo Horizonte, 07 de março de 2012

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XVII Encontro Nacional de Geógrafos - XVII ENG

Belo Horizonte – 22 a 28 de julho de 2012

UFMG – Campus Pampulha

Tema: Entre escalas, poderes, ações, Geografias

 

A escolha do uso da preposição “entre” como relação dos termos não é desprovida de intenções na definição do tema do XVII ENG. Sugere dois movimentos possíveis. O primeiro, mais óbvio, indica a necessária relação entre os mesmos, sugerindo várias combinações possíveis: aos pares teríamos seis combinações: Escalas-poderes; escalas-ações; escalas-geografias; poderes-ações; poderes-geografias; ações-geografias. Muitas outras combinações seriam possíveis entre três termos ou entre os pares e trios. Pensamos que a unidade dos termos, sua combinação aos pares e as relações dos quatro termos são suficientes para o desenvolvimento do tema.

O segundo sugere o uso como vetor locativo e, aí, a preposição entre indica o local em que o vetor se encontra, logo entre os termos relacionados. Neste caso, podemos indicar infinitos “pontos” entre os termos.

Os termos propostos como tema do XVII ENG requerem uma discussão na qual não haja uma centralidade e nem a dominação de um dos termos sobre os demais, de modo a não se determinar de antemão uma direção para o pensamento cujo fim já se anuncia no começo. Todos os termos encontram-se no mesmo nível conceitual. Se o processo de construção do tema se faz e refaz continuamente no debate interno à AGB, devemos levar esta construção às ultimas conseqüências. Apropriando-nos do “entre” como verbo, que nos traz a idéia de processo e de movimento, convidamos os geógrafos para o debate político, para que adentrem as lutas e o movimento do mundo.

Pensamos que a partir das possibilidades expostas anteriormente emergem os eixos, linhas, teses, enfim, conteúdos do ENG.

Escalas

A escala, enquanto instrumento cartográfico para expressar espacialmente determinado fenômeno ou processo social, é apenas a forma mais difundida de utilização do conceito. Antes de tudo, a escala é uma espécie de proto-conceito, na medida em que é próprio do pensamento analítico diferenciar e qualificar fenômenos e processos, de sorte que todos os demais conceitos que utilizamos são passíveis de serem escalonados. Não apenas em termos dimensionais, mas também de intensidade, ritmo e tempo em que os fenômenos e processos ocorrem. Em outras palavras, escalas se definem a partir de relações, suscitando uma abordagem conjunta de suas dimensões componentes, para além da simples expressão. O que é uma metrópole? Por acaso se define simplesmente pela extensão do tecido urbano? Sua existência pode ser entendida dentro dela mesma ou, ao contrário, as suas intrincadas relações endógenas e exógenas representam um aporte à investigação analítica em sua proposta de compreender e ultrapassar o caráter fenomênico imediato da mesma? A reflexão colocada neste nível nos permite alcançar uma esfera mais ampla da realização social moderna, a partir da sua produção, que realizada segundo o ritmo da intensificação produtiva, utiliza do aumento da intensidade do trabalho para a compressão do tempo de produção e conseqüente aumento da dimensão produzida, que em termos de valor abriga em cada unidade, mercadoria, uma quantidade menor de trabalho materializado – “Crise do Valor”. A partir desta acepção de escala, o pensamento alcança a medida escalar fundamental da sociedade moderna: tempo de trabalho socialmente necessário.

Poderes

O poder apresenta-se como a articulação entre duas forças, a riqueza e a violência, que se equivalem e são interdependentes, para subordinar as demais. É a compreensão dessa relação que pode impelir o conhecimento ao combate ao poder, de sorte que torna-se fundamental compreender as relações de poder que se constituem e materializam, nem sempre de forma visível, no interior de uma sociedade dividida em classes. O poder não se manifesta apenas de formas violentas, mas também pela sedução que chega a cooptação. O poder predominante já não é o concreto, mas o avassalador poder do capital em suas formas abstratas. Formas presentes na cotidianidade e produtoras do espaço. De quem é a prerrogativa na definição dos usos e da apropriação do espaço geográfico? Quem determina forma, ritmo, intensidade do trabalho efetivado na produção deste espaço? De que forma se efetiva o poderio econômico nos dias atuais? Quais são as forças que tensionam o poderio econômico do capital, ou seja, que outros poderes existem no mundo contemporâneo? Este é o nível inicial que imaginamos como o mais profícuo ao debate à que se propõe a geografia, da promoção de um espaço da práxis aberto para um devir emancipatório.

Ações

Ações é um termo que nos remete sempre a um verbo: fazer, criar, realizar, sujeitar, pensar, destruir, criticar, aprovar. As orações (e ações), porém, não são dadas pelo verbo ou pelas ações, mas pelo sujeito delas, cuja transform-ação leva à práxis. Devemos, portanto, mais do que discutir as ações, pensar sobre o sujeito que realiza esta ação. Que sujeito é este? O espaço geográfico é um sujeito? Que sujeito produz o espaço? Ou existe processo sem sujeito? Questionar estes pontos nos traz a possibilidade de refletir até que ponto nossas ações não passam de reações às determinações do mundo moderno, não alcançando a possibilidade de antecipar o processo.

Geografias

Quantas são as Geografias possíveis? Se pensarmos através de seus recortes quantas são as Geografias? Recortes que podem ser de objeto (urbana, agrária, natureza, etc), de método (teorética, crítica, dialética), de escala (bairro, cidade, metrópole), político (movimentos sociais, Estado, comunidades tradicionais)... São tantos cortes possíveis e tantos recortes da Geografia que por vezes chegamos a nos questionar sobre a possibilidade de uma Geografia inteira. Nesse sentido, o ENG se apresenta como espaço privilegiado para o encontro destas geografias e de debate entre todas as correntes teóricas e epistemológicas da Geografia brasileira. Geografias que se reconhecem e que enxergam no encontro uma possibilidade de divulgação de seus trabalhos e de diálogo com aqueles que escolheram a profissão de Geógrafos. Portanto, pretende-se reunir não mais os iguais, que pesquisam os mesmos temas e se encontram em seus eventos específicos, mas, sobretudo, os diferentes enfoques, práticas e perspectivas da Geografia.